Novos produtores estão liderando uma revolução no mais famoso vinho italiano. Agora, a elegância é a protagonista
Conta-se que o mais famoso vinho italiano, o Barolo, adornava os banquetes da nobreza europeia no século XIX. Era a bebida oficial da Corte de Savoy e também oferecida à Realeza em suas visitas ao território. Por essa razão, ganhou o apelido de “O Rei dos Vinhos, o Vinho dos Reis”. Era uma época em que o néctar e o território viviam seu primeiro auge. Não é difícil compreender tal prestígio.
Jamais esquecerei a primeira vez que visitei a área de Langhe, onde as uvas dessa denominação são cultivadas. Apaixonei-me por cada paisagem que se revelava diante de mim. Os vinhedos cobrem as colinas, criando um mosaico de tons verdes que se transformam em dourados na estação de colheita. As vinhas, frequentemente envoltas em neblina matinal, apresentam um cenário quase mágico. As montanhas ao fundo, muitas vezes cobertas de neve, oferecem um contraste majestoso e um lembrete constante do clima fresco que define a região. Esse cenário é o lar do Barolo DOCG, o mais prestigiado e valorizado de Langhe. São vinhos elaborados inteiramente com a uva Nebbiolo, secos, muito tânicos e com alta acidez. Produtos de longa guarda, que aprimoram com o tempo. Porém, no século XIX, a bebida tinha um perfil semi-doce, mais palatável para a época.
No século seguinte, após as duas guerras mundiais, destacou-se pela intensidade e menor quantidade de açúcar residual. Esse perfil de produto coincidiu com o surgimento de grandes vinícolas e cooperativas. Com maior capacidade de produção e investimento, elas ajudaram o Barolo a conquistar uma Denominação de Origem (DOC), sendo uma das primeiras da Itália. E, algumas décadas depois, obteve o reconhecimento ainda mais elevado de DOCG. Mais uma vez, o Vinho dos Reis era celebrado em uma segunda era de ouro.
Na década de 1980, uma nova transformação teve início. Pequenos viticultores, descontentes com os baixos preços pagos por suas uvas, iniciaram um movimento de mudança. Liderados por Elio Altare, optaram por elaborar o vinho e amadurecer em barricas novas francesas, deixando de lado os tradicionais "botti" velhos. Rapidamente, esse novo estilo conquistou muitos apreciadores. Além de Altare, vinícolas como Roberto Voerzio, Domenico Clerico, Luciano Sandrone e Paolo Scavino ganharam grande destaque.
Atualmente, vivenciamos outra transformação. Novos produtores estão liderando uma revolução na quarta era do Barolo, onde a elegância é a protagonista. São vinhos mais frescos, frutados e com taninos menos adstringentes. Muitos deles também se destacam por práticas orgânicas, fermentação espontânea e mínima intervenção. São tintos adequados para consumo mais jovem, mas que ainda assim envelhecem bem. Ferdinando Principiano, que aprendeu com ícones como Giacomo Conterno e Voerzio, é um dos pioneiros dessa mudança, apresentando seu toque pessoal. Giulia Negri, Giovanni Rosso e Ca’di Press estão se destacando também nessa nova onda.
A maioria dessas vinícolas já chegou ao Brasil. Apesar dos preços elevados associados à denominação – não há Barolo barato –, a variedade de estilos disponíveis amplia as opções para os enófilos. Vale a pena explorar, degustar e comparar os diferentes perfis, e desfrutar da quarta era do Rei dos Vinhos.
Veja abaixo matéria original
FONTE: matéria publicada pelo prof. Marcelo Vargas para a Revista Prazeres da Mesa - EDIÇÃO 240
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